PUBLICIDADE

Imagens para sorrir e chorar

Por Eduardo Nicolau
Atualização:

Para um garoto de 9 anos em 1982, como eu, nenhuma seleção foi tão inesquecível quanto a dirigida por Telê Santana naquele ano e nenhuma foto de Copa do Mundo emocionou tanto. No trágico dia 5 de julho, o garoto José Carlos Rabelo tinha os mesmos 9 anos quando entrou no foco do fotógrafo Reginaldo Manente, do Estado. Manente deu as costas para o gramado do Estádio Sarriá, em Barcelona, onde os jogadores brasileiros ainda saíam desolados, e congelou em imagens o suspiro, o choro embargado de um país inteiro. 

A tristeza da eliminação da seleção de Sócrates, Zico, Éder, Falcão e tantos outros ídolos, amada como nenhuma outra depois dela, resultou num trauma - e numa capa de jornal inesquecível. 

PUBLICIDADE

Nestas duas páginas, o craque das lentes Reginaldo Manente nos presenteia pela primeira vez com a sequência original do negativo de onde saiu o fotograma que eternizou a tristeza do garoto na capa do Jornal da Tarde de 6 de julho de 1982. Nas fotos que se seguem, ele é consolado pela mãe, Vânia, ex-Miss Fluminense. 

“No primeiro suspiro do menino, quando virei de costas para o campo, eu ainda estava longe”, conta Manente. “Quando me aproximei, a mãe dele, Vânia, percebeu minha presença e por ter chorado também, começou a se maquiar. Nessa hora veio o segundo suspiro choroso do José Carlos, que ignorava totalmente minha presença. Por fim, na sequência, Vânia amparou o filho.” 

Manente é um fotógrafo que sempre lutou contra o óbvio. Durante o longo período em que trabalhou no Estado, de 1959 a 1988, ganhou nada menos que quatro Prêmios Esso. Creio que sua grande característica era captar as sutilezas, a felicidade e a tristeza em ambientes nem sempre propícios a esse tipo de registro. Ao observar suas fotos, imagino que ele pensava que não deveria captar aquilo que normalmente se espera de um fotógrafo: tentava justamente arriscar e trazer o novo. Tinha a rara qualidade para um fotógrafo de futebol de entrar em campo e pensar “o que vou fazer aqui hoje?”, antes de acionar o disparador de sua câmera. Curiosamente, mas não por acaso, suas melhores imagens de Copas são justamente sem a bola. 

Essa característica fica clara nas outras fotos exibidas aqui, de outras Copas do Mundo: o choro de alegria de Amarildo no Chile em 1962, ao final da partida contra a Espanha, em que fez dois gols e tirou o peso das costas que era substituir Pelé - ganhadora de um Prêmio Esso; Pelé, já considerado o maior jogador do mundo, recebendo o carinho de crianças chilenas, antes da contusão na mesma Copa; ou Maradona erguendo a taça no México em 1986. 

“A Copa do Mundo reúne uma seleção dos melhores fotógrafos dos maiores jornais do mundo. A responsabilidade é gigantesca. Você não ficar para trás já é uma grande conquista nesse tipo de cobertura. Nessas ocasiões, eu não pensava em conseguir nenhum furo - só queria sobreviver à Copa”, diz ele, com modéstia. 

Publicidade

Pouco depois da foto que se tornaria capa em 1982, Manente comentou com seu companheiro de equipe Alfredo Rizzutti: “Acho que fiz uma fotografia bonita”. Rizzutti sacou na hora o verdadeiro gol de placa que o colega havia feito. E respondeu: “Ah Manente, fotografia bonita a gente faz toda hora...”.

*

Eduardo Nicolau é fotógrafo, editor de Fotografia do Estado e autor de 'Retrato de Jornal' (Letras do Brasil)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.