James Wood é o novo verdugo da literatura norte-americana

Crítico se estabelece entre os principais e mais ferinos em relação às obras alheias

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Por Antonio Gonçalves Filho
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James Wood dá aulas em Harvard, onde John Updike (1932-2009) e Susan Sontag (1933-2004) se formaram. Seguindo os passos de Updike, que substituiu Edmund Wilson (1895-1972) na revista The New Yorker, James Wood, a despeito de ter nascido na Inglaterra, quer marcar presença e passar à história como o grande crítico da América no século 21. Edmund Wilson, aos 36 anos, já era um crítico consagrado, autor do seminal O Castelo de Axel (1931), revolucionário estudo sobre os primeiros vanguardistas da virada do século 19 para o 20, de Rimbaud a James Joyce, nunca esquecendo que Ulisses, em 1931, ainda era um livro proscrito nos EUA. Wilson defendeu Joyce, classificando Ulisses como o primeiro romance “mais completamente escrito” desde Flaubert.

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Pode-se discordar ou não de Wilson, mas todas as suas apostas literárias deram certo. Mais exemplos? Hemingway, John dos Passos e F. Scott Fitzgerald, que, ao morrer, em 1940, deixou incompleto O Último Magnata, publicado um ano depois (1941). Coube a Edmund Wilson editar a versão que circula. Wilson era um crítico amigo de escritores – e ele mesmo foi casado com Mary McCarthy, a autora de O Grupo. Nabokov tinha por ele grande respeito, como atestam as cartas trocadas entre ambos.

James Wood, na esteira de Edmund Wilson, defende que a recorrência de Nabokov ao detalhe (nunca esquecendo que o russo era entomologista) foi minuciosamente estudada por outros escritores, a ponto de ter “uma influência avassaladora, e nem sempre muito proveitosa, sobre duas ou três gerações depois dele” – Wood, malicioso, cita John Updike como exemplo de seguidor pouco inspirado de Nabokov. E, mais de uma vez, alfinetou o escritor. Foi o caso do livro Terrorista: Wood acusou Updike de oportunismo, por eleger como protagonista um adolescente muçulmano que se mata em nome do Islã. “John Updike deveria ficar a quilômetros de distância de um tema como esse”, resumiu o crítico. E mais: diz que Updike foi um ventríloquo que, em Terrorista, não soube dar sua voz ao seu boneco ou dissimular o timbre da própria voz.

Wood estaria, assim, entre a aguda pontaria de Gore Vidal e a erudição de Susan Sontag, dois dos notáveis que o precederam nas páginas da crítica nova-iorquina. Vidal era o rei dos aforismos, dos insultos e das verdades inconvenientes. Deixou sua marca como ferino crítico da obra alheia e condescendente quando se tratava da própria. Já Susan Sontag, que estudou filosofia em Harvard, trouxe para a cena norte-americana complexos autores europeus, como Sebald e Halldor Laxness, e sul-americanos, como o brasileiro Machado de Assis, obrigando os editores americanos a não olhar só o próprio umbigo.

Há, sim, um peso ideológico nas críticas de Sontag que não se encontra em James Wood. Como Harold Bloom, outra figura do panteão crítico americano, Wood considera que os escritores precisam manter uma razoável distância do discurso político para produzir boa literatura. Prega um compromisso estético do autor com a literatura. No ano 2000, ele cunhou o termo “realismo histérico” para definir o que considera um gênero literário típico do nosso tempo – ambicioso, épico, que “persegue a vitalidade a qualquer custo”. A vítima que o levou ao termo foi Zadie Smith e seu livro Dentes Brancos, saga que pretende ser um resumo dos conflitos étnicos e religiosos da Inglaterra. Entre outros “histéricos realistas” pós-modernos, James Wood relaciona Don DeLillo, Thomas Pynchon e David Foster Wallace. O homem é mesmo corajoso.

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