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A herdeira trabalha em silêncio

Apoio de Caroline a Obama superou o patamar da tietagem, revelando o melhor cérebro no clã dos Kennedys

Por Lois Romano
Atualização:

Não faltaram críticos ruidosos à decisão de Barack Obama de nomear a única filha sobrevivente de John F. Kennedy para integrar a equipe encarregada de selecionar (e vetar) nomes para a lista tríplice de candidatos à vice-presidência. Os críticos questionaram as credenciais de Caroline Kennedy para a missão e sugeriram que o candidato democrata tenta se associar ao legado de Camelot. Mas a indicação pareceu bastante astuta, principalmente depois da saída abrupta de Jim Johnson do comitê para a escolha do vice de Obama (vice presidente selection committee). Figurinha conhecida nos círculos políticos de Washington, Johnson vive cercado de especulações sobre seus empréstimos pessoais. Agora, o Partido Republicano arrumou outro alvo: o terceiro membro do comitê do democrata, o ex-procurador do Departamento de Justiça Eric Holder, por seu papel no polêmico perdão a um financista fugitivo, Marc Rich, já no fim da presidência Clinton. Caroline Kennedy, no entanto, parece ter ficha limpa e nenhum passivo político atacável. "O senador tem muito respeito pelo caráter dela", reconhece David Axelrod, principal estrategista de Obama. "Ele queria ter no comitê alguém fora de Washington."Já a consultora democrata Donna Brazile diz que a presença de Caroline no grupo traz um senso de história e decoro ao processo político como um todo, beneficiando Obama. Fontes do Partido Democrata avaliam que, embora o nome mágico dos Kennedys a possa ter colocado na pauta, Caroline é uma advogada e escritora bem-sucedida - não entraria em algo como um mero enfeite de janela. Seu papel nessa busca intensa, que está somente no começo, será trazer uma perspectiva mais ampla para um processo que, com freqüência, se transforma num concurso de beleza degradante para políticos profissionais. Os encarregados do trabalho de vetar e investigar candidatos potenciais a vice-presidente geralmente trabalham em segredo - e Obama já cobrou que não haja vazamentos. Eles compilam uma longa lista de possibilidades entre os vice-presidenciáveis, avaliam interesses, pedem que os postulantes preencham históricos intermináveis, analisam seus registros financeiros e fiscais. Por fim, entrevistam um grupo de finalistas. Além de encontrar uma pessoa que complemente o candidato presidencial, tanto pessoal como politicamente, o objetivo do comitê é se assegurar de que a pessoa que recomendarem não tenha esqueletos no armário. O trabalho condiz perfeitamente com o estilo de Caroline Kennedy: ela tem proeminência o suficiente para funcionar como uma espécie de lembrete público - que os americanos não se esqueçam de que, um dia, ela comparou Obama a seu pai -, mas também é discreta o bastante para operar intensamente, longe dos holofotes. A filha de Jackie (Kennedy) Onassis está perfeitamente ciente da importância que seu nome e sua voz carregam, razão pela qual os tem usado com parcimônia ao longo dos anos - e sempre em seus próprios termos. Foi Caroline quem decidiu que seu inesperado endosso a Obama, no meio de uma primária disputadíssima, tomaria a forma de um editorial no jornal The New York Times. "Embora tenha havido conversas entre ela e o senador, o momento da decisão foi inteiramente dela - sem jamais ter sido pressionada pelos estrategistas da campanha", afirma Axelrod. Muitos membros do partido ficaram encantados por ela se envolver com tudo na campanha de um não membro de sua família, muito mais do que jamais fizera antes para os parentes. Mas, atenção, não esperem vê-la fazendo campanha num canal de TV a cabo. Desde que endossou Obama, Caroline deu somente uma entrevista, conduzida pelo senador Edward Kennedy, seu tio, como parte da exposição do endosso, em fevereiro. Mais significativo do que o que ela falou, foi, de fato, o que ela fez: viajou pelo país, cruzando Texas, Ohio, Kentucky e Indiana, falando em cidadezinhas e centros comunitários, registrando eleitores em estações de trem e centros comerciais. "As pessoas às vezes ficam um pouco surpresas de me ver aqui. Eu mesma me surpreendo, porque jamais estive dentro de uma campanha política", reconheceu Caroline diante de algumas centenas de pessoas, num auditório da cidadezinha de Boonville, Indiana, no mês passado. "Mas acredito que esta sseja a eleição mais importante desde que eu era criança. E já completei 50. Imagino, então, que se é caso de entrar, então o momento é este." Alguém que a conhece bem disse que sua decisão de se manifestar a favor de Obama reflete uma admiração sincera pelo senador por Illinois, além de sua crença pessoal de que ele poderá ser o primeiro presidente, desde seu pai, a inspirar os jovens e a unir a nação. Caroline disse que foram seus três filhos que a trouxeram para Obama. Ela levou discretamente a filha Tatiana, então com 17 anos, para ouvi-lo falar no verão passado em Nova York. A revista Newsweek noticiou que, ao saber que Caroline estivera no local, Obama telefonou-lhe. Foi quando se falaram pela primeira vez. Ela compareceu a outros eventos sem espalhafato, leu o livro dele e acompanhou atentamente a campanha de longe. Foi só depois de Iowa que manifestou seu apoio ao democrata. Axelrod também já admitiu que Caroline se mostrou "disposta a fazer tudo que lhe pedissem" para a campanha. Amigos dizem que ela tem um agudo entendimento de seu lugar na história e aprecia a expectativa geral de que herdou a missão de manter a memória de sua família viva. É por isso que não se esquiva de invocar a lembrança de seu pai e de seu tio Robert Kennedy, sempre que precisa. Contou à multidão em Boonville que se lembra da noite em que Bob Kennedy venceu a primária de Indiana, na primavera de 1968: "Foi uma noite tão alegre para nossa família...Por isso estou tão feliz de estar aqui." Há muito tempo Caroline é vista como o cérebro mais privilegiado no exército de primos do clã Kennedy, apesar de ter atravessado uma infância trágica e uma seqüência de dramas na vida adulta. Sabe-se que ela cresceu sendo caçada por paparazzi na Quinta Avenida e repórteres à porta da escola. Mas, embora o público tivesse tentado transformá-la em uma daquelas mulheres emblemáticas, etéreas, que despertam desejos de apropriação - como sua mãe ou a princesa Diana -, ela manteve a família e sua vida privada bem longe da curiosidade pública. Mesmo sem ter assumido um papel ativo no negócio familiar quando adulta, ela escreveu livros sobre liberdades civis, é considerada uma especialista na Primeira Emenda e editou uma versão do livro de seu pai, Profiles in Courage. Passou as duas últimas décadas criando os filhos e está particularmente envolvida com a Biblioteca Presidencial John F. Kennedy, cuja fundação preside. Também é a prima mais próxima de Maria Shriver - foram até damas de honra uma da outra - e a sobrinha dileta do tio Ted, com quem conversa regularmente. Al Hunt, presidente do Profile in Courage Award Committee, diz que tio e sobrinha têm especial afeto um pelo outro. Pode ser traduzido em outros termos: Caroline e tio Ted vivem se provocando. Mas de uma maneira inteligente e amorosa.

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