Conheça obras que trafegam entre ficção científica, fantasia, suspense

Patrick Suskind, Naben Ruthnum e Roberto Bolaño são alguns dos autores que mesclam os gêneros; saiba como defini-los

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Por Silvia Moreno-Garcia e Lavie Tidhar
Atualização:

Atenha-se a uma linha e escolha um gênero é um conselho comum para aspirantes a escritores. Mas, na literatura, todas as regras podem ser quebradas. Muitos grandes escritores nos fazem pensar na prateleira onde devemos pôr seus livros: ficção científica, fantasia, suspense ou... tudo junto e misturado? Vamos discutir alguns dos melhores livros que desafiam a categorização.

Silvia: The Darkangel (1982), de Meredith Ann Pierce, é um fascinante romance para jovens adultos que, tecnicamente, seria ficção científica: é ambientado num futuro nebuloso e distante, mas parece um conto de fadas. Um vampiro precisa arranjar catorze noivas antes de se tornar imortal, mas as coisas se complicam quando uma jovem invade seu castelo. Uma leitura encantadora.

Kevin McCarthy, King Donovan, Carolyn Jones, e Dana Wynter em 'Vampiros de Almas'. Foto: Walter Wanger Pictures

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Perfume (1985), de Patrick Suskind, foca num homem das favelas da Paris do século 18 com um olfato tão sublime que acaba saltando para o reino do fantástico. Mas também é a história de um serial killer em busca do perfume perfeito – e da vítima ideal. Da mesma forma, The Prestige (1995), de Christopher Priest, a princípio pode parecer um romance histórico em forma epistolar sobre dois mágicos rivais. Mas, à medida que o livro avança, vira meio mistério, meio ficção científica.

Titus Groan (1946), de Mervyn Peake, é descrito como uma “fantasia de boas maneiras” e um romance “gótico”, embora nenhuma das definições seja muito precisa. O enredo detalha a vida num castelo labiríntico, revelando um grande elenco de personagens e seguindo as maquinações de um ajudante de cozinha que quer ascender socialmente. Piranesi (2020), de Susanna Clarke, compartilha uma semelhança com o castelo Gormenghast inacreditavelmente imenso de Peake, então, se você gostou de um, vai gostar do outro.

Lavie: A trilogia Lost Detective, de Shimon Adaf, será lançada neste verão, traduzida do hebraico por Yardenne Greenspan. Se o primeiro romance, One Mile and Two Days Before Sunset, é um mistério quase tradicional, ambientado no rescaldo do breve renascimento do rock israelense nos anos 90, o terceiro (e épico) volume, Take Up and Read, já se transforma em ficção científica, combinando ficção realista, narrativa policial e outras coisas completamente bizarras. Mas, mesmo no primeiro livro, o amor de Adaf pela ficção científica se expressa por meio de sua heroína, Elish Ben Zaken, cujas leituras fazem referência aos clássicos do gênero. Se você gosta de Roberto Bolaño, vai gostar de Adaf.

O escritor chilenoRoberto Bolaño, autor de 'Literatura Nazista na América' Foto: Companhia das Letras

Falando em Bolaño – outro escritor que tinha um amor genuíno pela ficção científica – tenho uma queda por seu Nazi Literature in the Americas (2008), traduzida do espanhol por Chris Andrews. Todo mundo deveria ler Bolaño, mas, se você sofreu com o épico 2666, pense neste outro como uma porta de entrada mais fácil – uma saga sinuosa de sonhadores, conspiradores e, sim, escritores de ficção científica fascistas que é uma alegria do começo ao fim.

Silvia: Para quem busca leituras mais curtas, recomendo a novela Helpmeet, de Naben Ruthnum. Uma mulher cuida do marido doente, que sofre de uma condição que leva essa história do reino da ficção histórica para a ficção bizarra. Às vezes conto de horror profundamente perturbador e outras vezes história de amor terna, é um dos melhores livros que li este ano. Por fim, Lesser Known Monsters of the 21st Century, de Kim Fu, é uma adorável coleção de contos ecléticos que tem de tudo – desde simulações virtuais com mortos até um homem feito de areia.

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Lavie: Perturbador e terno me lembram Taken by the T-Rex (2013), de Christie Sims e Alara Branwen, que tomou o mundo literário de assalto e inaugurou uma nova era de ouro do gênero dinosaur erotica. Sim, isso existe – misturar gêneros é pouco!

Paris Adrift (2018), de E.J. Swift, tem seu jovem protagonista trabalhando até tarde num bar em Montmartre – onde a adega fornece uma série crescente de lapsos temporais na história de Paris. Ficção científica, aventura histórica ou romance de formação contemporâneo? Tudo isso e mais um pouco.

Petter Weller interpretou o Robocop pela primeira vez em 1987. Foto: Acervo Estadão

Para fechar, um dos romances de ficção científica mais engraçados e surpreendentes dos últimos anos só pode ser Version 43 (2010), de Philip Palmer, no qual um ciborgue parecido com o RoboCop (o “Versão 43” do título) é enviado para um planeta remoto para investigar um crime. Ele prontamente o faz, descobre a conspiração por trás de tudo e é assassinado. Entra em cena a Versão 44. Os corpos se acumulam nesta mistura de ficção científica, história de detetive e suspense de conspiração – com muito humor e uma energia hipercinética de tela grande.

E você, caro leitor? Quais títulos difíceis de classificar você adora?

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Silvia Moreno-Garcia é autora de Mexican GothicVelvet Was the Night e The Return of the Sorceress. Os romances mais recentes de Lavie Tidhar são The Escapement e The Hood. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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