Foi como se Faustão tivesse confundido Marieta Severo com Dona Nenê, a personagem que ela interpretou durante 14 anos em A Grande Família. Da personagem, Marieta só tem a simpatia e a delicadeza. Firme em suas convicções, bem informada e decidida, a atriz desconcertou o apresentador em seu programa de domingo passado. Bastou ele improvisar um pequeno discurso pintando o Brasil como “o país da desesperança”, para Marieta, simpática e delicadamente, puxar a questão da inclusão social e deixar bem claro que não tem medo da crise atual. “Já passamos por outras. A gente vai sair dessa”, ressaltou, culminando sua réplica otimista com uma profissão de fé nas “muitas qualidades” do Brasil.
Não era bem a resposta esperada por Faustão, que, simpática e delicadamente, encerrou às pressas a conversa: “Essa é Marieta Severo, galera!”.
Marieta calou o apresentador mas não calou a imprensa nem a mídia digital. O Domingão do Faustão repercutiu durante toda a semana. Críticas e mensagens de apoio à atriz pipocaram de todos os lados.
“Acabo de assistir a Marieta Severo calando a boca do Faustão. Cara, eu vou casar com essa mulher”, escreveu um fã no Facebook. “Com todo esse dinheiro da Lei Rouanet eu também teria ‘personalidade’, pichou outro internauta. A atriz Luana Piovani, notória fabricante de polêmicas, postou em seu Instagram: “Mas que fonte de otimismo é essa que bebe a diva Marieta?? Preciso me banhar nela... Não aguento mais tantas mortes ao meu redor, tanto descaso...”
Nesses 50 anos de carreira e um pouco mais de vida, Marieta jamais deixou de ser uma típica garota dos anos 1960. Aos 15 começou a namorar o artista plástico Carlos Vergara; aos 18 já estava casada; aos 19, já separada, encantou-se por Chico Buarque, com quem viveu 33 anos, teve três filhas e sete netos. Sua vida desconhece a monotonia. Tinha apenas 22 anos ao estrelar Roda Viva, o musical do marido que tanta irritação causou ao regime militar e a grupos de direita. Corria o ano de 1968, logo seria decretado o AI-5, e Marieta entrou na lista negra dos agentes da segurança nacional ao lado de Chico.
Depois de passar uma noite preso, a “prestar esclarecimentos” sobre suas canções, Chico decidiu respirar outros ares. Em janeiro de 1969, o casal partiu para Roma, onde morou 15 meses. Lá nasceu a filha mais velha, Silvia, atriz como a mãe. De volta ao Brasil no final de 1970, Marieta participou de uma novela na extinta TV Tupi, E Nós, Aonde Vamos?, dirigida por Sérgio Britto. E deu um bom tempo na profissão. Mãe outras duas vezes, de Helena e Luisa, praticamente adotou Janaína, a filha de sete meses de Leila Diniz, quando a amiga morreu num acidente de avião em Nova Délhi, em 1972.
Foi totalmente por acaso que se tornou atriz. Acompanhando uma amiga num teste para o filme Society em Baby Doll, de 1965, aceitou o convite do diretor Luiz Carlos Maciel para fazer um papel. Do batismo no palco, na peça As Feiticeiras de Salém, lembra-se sobretudo da sensação de insegurança. “Era muito verde”, gostava da coisa, mas ainda não tinha certeza do que realmente queria na vida. Até que esta a levou para a televisão. E assim foi que ela estreou numa telenovela, O Sheik de Agadir, grande sucesso na época. E nunca mais parou.
Há dez anos tornou-se dona de dois teatros, de sociedade com a amiga Andréa Beltrão. Primeiro foi o Poeira, num sobrado tombado pelo Patrimônio Histórico, na zona sul carioca. Pouco depois compraram a oficina ao lado e a transformaram no Poeirinha. Este é também o tempo de namoro de Marieta e Aderbal Freire-Filho, diretor de teatro e ator bissexto.
Nada, porém, consegue afastar a atriz da família. Aos sábados costuma receber filhas, genros e netos em sua casa, encontros que chama de sabadões: “Junto a turma - minha e da Andréa - todos correndo de lá pra cá, e nós, adultos, à beira da piscina tomando cerveja e conversando”.
Por tudo isso nem Faustão se surpreenderia com a resposta de Marieta ao ser entrevistada há pouco tempo no programa Starte, da Globo News. Quando a jornalista Bianca Ramoneda indagou se ela era a mulher maravilha a atriz soltou uma frase bem ao estilo da garota anos 1960: “Somos todas um pouco, não?”
Essa sim é Marieta Severo, galera.
MARIA LUCIA RANGEL É JORNALISTA, AUTORA DO LIVRO AULA DE SAMBA