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Infelizmente, acontece todos os dias

A legislação é suficiente para tratar do problema, mas precisa ser traduzida em ações

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Por Redação
Atualização:

RITA CAMATA DEPUTADA FEDERAL PELO PMDB-ES Relatora do Projeto que originou a Lei 8.069/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é uma das fundadoras da Frente Parlamentar de Defesa da Criança e do Adolescente no Congresso A violência sexual, principalmente contra crianças, é terrível agressão à liberdade do indivíduo, manifestação extrema do domínio de uma pessoa sobre outra. Reúne violências múltiplas. E, infelizmente, acontece todos os dias. Além de serem explorados no trabalho; de serem vítimas de violência moral, física e do extermínio; vítimas da fome, da desnutrição e da miséria, meninos e meninas são vítimas também do conservadorismo de parte da sociedade, que os considera culpados por sua própria situação. São duplamente violados. Pelo abusador, e pelo Estado, nas delegacias, nos postos de saúde, nas escolas que não estão preparadas para recebê-los. E, principalmente, na impunidade dos culpados. Não é raro encontrarmos entre os agentes da violência e exploração os que deveriam proteger, como pais, mães, avós, e até agentes públicos - policiais, vereadores, médicos, juízes, prefeitos... Cada vez que somos impactados por acontecimentos relativos à violência sexual, amplamente divulgados pela imprensa, as discussões voltam com fervor devido ao clamor popular pela solução do problema. Com razão a sociedade cobra das autoridades competentes. Afinal, é papel do Estado assegurar o desenvolvimento de políticas integradas para efetivar os direitos básicos desses cidadãos, como educação, saúde, convivência familiar e comunitária, segurança, cultura, lazer, proteção contra qualquer tipo de negligência ou violência. Está na lei. Garantam-se recursos. Cumpra-se! A legislação brasileira é suficiente para trabalhar a questão de imediato. Mas é fundamental que seja traduzida em ações. Em 2000 o governo lançou o Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil, com o objetivo de comprometer a sociedade civil na luta contra o problema, criando e fortalecendo um conjunto de ações e metas para assegurar a proteção integral à criança e ao adolescente em situação ou risco dessa forma de violência. Estamos em novembro de 2008 e o plano ainda não foi implementado. Na área da educação precisamos de escolas em período ampliado, ou de período integral, com acesso não só à educação formal, mas também à cultura, ao esporte e ao lazer. A escola não está preparada para acolher vítimas de violência sexual. A política assistencial deve criar possibilidades das famílias conseguirem sua própria renda, em vez de serem eternamente tuteladas pelo Estado. A complementação de renda, por meio de programas sociais, e os Centros de Referência e Assistência Social - Cras são fundamentais, se bem equipados e com profissionais capacitados. Programas de educação profissional são estimulados, mas poderiam ir além, capacitando gestores, operadores públicos, para que ajam diante de problemas de violência sexual em suas localidades. Precisamos de uma fiscalização eficiente junto às DRTs - Delegacias Regionais do Trabalho. Todos sabemos que há crianças e adolescentes em trabalho doméstico, e há muito abuso sexual nesse setor. O atendimento nos estabelecimentos do Sistema Único de Saúde deve ser muito mais atuante no diagnóstico e na qualidade dos serviços oferecidos às vítimas. Não menos importante é agir, por meio de acordos internacionais, para a responsabilização de abusadores estrangeiros de nossas crianças e adolescentes nos seus respectivos países. Ocorre que quando a sociedade, a mídia e as autoridades concentram toda a atenção na violência propriamente dita, peca-se por deixar em segundo plano a necessidade de políticas públicas que liguem a obrigação de responsabilizar o culpado pela violação de um direito básico do ser humano - autonomia sobre seu corpo - com as ações de qualificação do atendimento e, o mais importante, de prevenção. Precisamos de investimento maciço em educação, ao lado, das políticas de denúncia, responsabilização e repressão. Precisamos solucionar o problema de forma conjunta, conhecendo como se dão as relações de gênero, as relações culturais, as estruturas familiares, tratando agressores para coibir a reincidência. Apesar de estatísticas mostrarem que crianças menos favorecidas têm sido mais vitimizadas, a violência sexual contra meninos e meninas não tem cor, nem religião, nem classe social. Precisa ser prevenida, denunciada, e combatida por todos.

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